Monday, April 19, 2010

Artur Soares: testemunhos da guerra em Moçambique


Com uma expressiva capa de Aurélio Mesquita, a editora Lugar da palavra apresentou ontem, na Biblioteca Lúcio Craveiro, em Braga, a mais recente obra de Artur Soares, com alguns textos publicados no jornal Correio do Minho, no qual colaborou durante quase uma década.

Testemunhos da Guerra do Ultramar” tem como cenário a actividade da Companhia de Caçadores 1571 do Regimento de Tomar, entre 1964 e 1966, no Norte de Moçambique, onde, ao fim de três anos perdeu nove homens e viu 59 dos seus soldados feridos.

Artur Soares era um dos furriéis dessa companhia numa guerra feita “apenas por milicianos” — conforme acentuou na sessão de apresentação da sua obra — e fomentada por aqueles que “não têm filhos para mandar à guerra e protegem da guerra os seus mais chegados”.

Habituada a editar livros de qualidade, a editora Lugar da Palavra encontrou no panoiense Artur Soares o escritor idela para se manter fiel ao seu lema: “dar a conhecer novos autores, numa altura em que o mercado editorial praticamente se fechou a novos talentos e, em vez disso, cada vez mais se abre à lógica do autor-futebolista-actor-de-nove-la-apresentadeiro-telegénico e afins” — como afirmou o seu fundador João Carlos Brito.

Na apresentação do livro, Costa Guimarães começou por Afirmar que estamos perante alguém que “escreve algo que valha a pena ler e fez algo acerca do qual valha a pena escrever”, sustentando que o tema interessa ainda hoje a milhões de portugueses que viram familiares seus morrer, ficar deficientes ou doentes com a Guerra do Ultramar.

Situando o assunto do livro, Costa Guimarães apresentou alguns números sobre a Guerra Colonial em Angola, Guiné e Moçambique: 8 290 mortos nas três frentes de combate.

A grande maioria dos que morreram caiu em combate, e aqui o número mais elevado registou-se em Moçambique (1 481); seguem-se Angola (1 306) e Guiné (1 240).

A acção testemunhada no livro de Artur Soares desenrola-se no Norte de Moçambique, nos anos 1964 a 1966, e ocupa metade do livro. A outra metade do livro é constituída por crónicas publicadas em alguns jornais, grande parte delas no Correio do Minho e que mantêm a Guerra Colonial e o seu fim como fio condutor das ideias.

Costa Guimarães definiu o autor como alguém que “aceita o conselho dos outros, mas nunca desiste da sua própria opinião. Nós sabemos qual é o seu rumo e ele assume-o com ousadia e humildade, partilhando-o com os seus leitores”.
Costa Guimarães desafiou o autor a reescrever e ampliar capítulo “O Galego”, desenvolvendo a história em forma romance, aproveitando outros elementos das outras histórias como a do Manhente e Lança granadas.

O desafio foi feito no fim da apresentação do livro em que Costa Guimarães desafiou os convidados a cantarem uma oração-poema que os soldados de Braga entoavam em Moçambique decalcada numa música tradicional.

De facto, considerou Costa Guimarães, o primeiro capítulo de “Testemunhos da Guerra do Ultramar” possui todos os ingredientes — desde o mistério, ao crime, passando pelas ruralidades (minhota e moçambicana), pela intriga, através da caracterização social e cultural do Minho e da vida em Ditadura, para ser um romance de intensa densidade psicológica.

Por outro lado, justificou o jornalista, seria uma obra oportuna dado que Moçambique asssiste hoje a um movimento de aproximação com Portugal, através do incremento da Língua de Camões como Língua materna entre os mais jovens.


QUEM É ARTUR SOARES?

Depois de lermos “Testemunhos da Guerra do Ultramar”, verificamos que Artur Soares é um daqueles bracarenses que conta a sua história porque a possui, uma vez que muitos outros não contam e outros tantos não têm para contar.

Artur Soares nasceu a 8 de Dezembro de 1943, em Panoias Braga. Começou a trabalhar como empregado de comércio aos 13 anos e fez o 2.º Ciclo – Liceu – como “aluno externo”. Estudou Filosofia, Cristologia e frequentou na Fundação Konrad Adenauer, em Bona – Alemanha, um curso intensivo de Sociologia. Fez o serviço militar obrigatório entre os anos de 1965 e 1968, terminando-o como Segundo Sargento Miliciano e com uma comissão de serviço na guerra colonial de Moçambique.
Aos 26 anos foi correspondente do jornal “O Primeiro de Janeiro” do Porto, em Vila Nova de Famalicão e, iniciou a sua colaboração com “Artigos de Opinião” nos jornais “Notícias de Famalicão”, “Expresso do Centro”, “O Gerezão”, “Correio do Minho”, “O Conquistador” e várias revistas, sem prejuízo da subida na carreira de funcionário público, onde atingiu a chefia de repartição de Finanças, na categoria de Tesoureiro Gerente de 1ª, em Maximinos.

Para ele, ainda hoje se morre na guerra (psicologicamente) lentamente. Na guerra, “a grande avalanche dos mortos são inocentes. Até a maioria dos militares que na guerra participam, não conhecem a totalidade ou todas as razões que levam à existência da guerra” — como escreve na página 52 de “Testemunhos da Guerra no Ultramar”.

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