Tuesday, January 3, 2012

De Guimarães a Braga: “tu fazes parte”. E nós?




Uma das mais bonitas surpresas que os vimaranenses podiam ter feito aos bracarenses está à vista de todos: um cartaz espalhado pelas avenidas principais da Roma Portuguesa com um coração estilizado cheio de gente dentro — a simbolizar a Capital Europeia da Cultura — a convidar os bracarenses — que celebram a Capital Europeia da Juventude, onde se declara: “tu fazes parte”.

Este convite “Tu fazes parte” que Guimarães dirige a Braga constitui o primeiro passo para um novo paradigma — ai que palavra tão na moda! — nas relações entre as duas principais cidades do distrito de Braga.

Na minha modesta opinião esta é a primeira grande celebração da Capital Europeia da Cultura, mesmo contra a corrente de uma certa opinião bacoca e parola, de modo a que os habitantes de um e outro concelho acabem, de uma vez por todas, com essa conversa bafienta e enterrem esse linguajar subdesenvolvido.

No tempo em que se inicia um novo acordo ortográfico, era bom bom que as duas cidades celebrassem todos os dias um novo acordo de linguagem e de sentimentos que apenas traz vantagens para as duas cidades e para os dois povos.

Se o ano que agora se iniciou, coloca as duas cidades sob os olhares dos europeus, isso deve-se à cultura, ao património, à juventude, não ao futebol.

É tempo da gíria da bola — sem qualquer estatuto europeu e derrotada pela maioria— deixar de alimentar rivalidades que não elevam os níveis das duas cidades ao patamar a que agora — por força das suas autarquias, do seu passado monumental, das suas associações, dos seus criadores de artes e dos seus jovens — foram justamente classificadas.

A gíria divide, separa, destrói, aniquila: contraria coração da CEC e destrói o símbolo dinâmico e apontado ao futuro da CEJ. Nem Guimarães nem Braga merecem que a minoria do jargão se sobreponha às grandes celebrações das duas cidades.

Braga responde com um desafio aos jovens a lutar pelas verdadeiras condições do seu desenvolvimento, no acesso ao mercado de trabalho e na realização dos sonhos. Também os jovens de Guimarães fazem parte e já foram convidados, ao longo de uma maratona que percorreu todos os concelhos do distrito.

Braga e Guimarães apontam o dedo adultos, detentores da gíria que nos embruteceram ao longo de décadas, negaram aos jovens os sonhos e os mantiveram anestesiados com jargões e uma vida sem valores.

O convite “Tu fazes parte” constitui é um desafio para despertarmos da conformidade ou do sono da aceitação acriteriosa da sociedade vazia e mesquinha, porque só assim pode ser mais humana, livre, verdadeira, justa, criativa, fraterna.

Que a cultura, lá, e a juventude, cá, nos façam sair a todos deste torpor que nos engaiola na mediocridade sem darmos conta da nulidade que somos quando nos limitamos a ser menos que macacos de imitação.

Este cartaz tropeça traduz uma das frases mais bonitas que me atropelaram ao longo da vida: não conseguimos segurar uma vela para iluminar o caminho de outra pessoa, sem clarearmos o nosso próprio.

A frase pertence ao médico americano Orison Swett Marden (1850 - 1924) segundo o qual "uma vela nada perde quando, com sua chama, acende uma outra que está apagada”, como se pode ler no seu livro How to get what you want (Como realizar aquilo que desejas).

A voz dos indignados ou um grito de Deus!

Há pequenos sinais de que o mundo está a mudar. Em Harvard, um grupo de 70 estudantes saiu da sala de aula de Economia base, para denunciar que o curso "possui uma limitada visão da economia que perpetua sistemas problemáticos e ineficiente de desigualdade económica no nosso sociedade de hoje.

Contrariando a opacidade e o silenciamento imposto por parte dos media, vão surgindo na internet tomadas de posição acerca do alcance e fundamento que os movimentos dos "indignados" estão a ter em muitas cidades do mundo, com particular destaque para a contestação que se mantém em Wall Street, um lugar altamente simbólico do sistema financeiro mundial.

O Movimento Ocupar Wall Street (OWS) pode ser visto como dando um grande impulso para a reforma das Finanças.
Inspirado pela primavera árabe e manifestação dos indignados "em Madrid, OWS começou em 17 de setembro de 2011 perto da Wall Street, símbolo do mundo financeiro.

Ele mostra a democracia participativa em acção. Começou despercebido com a escassa cobertura dos media, mas rapidamente OWS tinha se espalhado para 951 cidades em 82 países. Não tinha a intenção de se limitar aos EUA ou Finanças, mas para chamar a atenção para a crise mundial. É um grito de justiça económica, responsabilidade, democracia e dignidade humana. Para os cristãos, isso podia ser visto como um grito de Deus — como escreve Antonella Ferrucci, no Economy of communion.

Wall Street foi escolhida como símbolo de protesto, mas é preciso revisitar a crise financeira em 2008, quando o governo dos EUA socorreu os bancos em quase colapso devido à sua acção irresponsável, muitas vezes sem ética financeira, alimentada pela ganância.

O mercado mostrou-se ineficiente, imperfeito e irracional. Para evitar colapso financeiro, o governo dos EUA injectou neles 700 mil milhões de dólares.
O desemprego continuou a subir. Isso foi visto pelo cidadão como a privatização dos ganhos e socialização das perdas.
Com o sector bancário recuperado, os banqueiros continuaram com práticas de auto-serviço e compensação excessiva. Os senhores de Wall Street esqueceram a missão da banca, que é fornecer suporte à economia.

O movimento pode não ter qualquer agenda para os jornais e televisoes, mas tem um objectivo: a Justiça económica.
OWS denuncia a injustiça e a corrupção da política pela finança, lobby e contribuinte das campanhas políticas, que paralisa o governo para o bem comum.

A amizade e o respeito demonstrado pelas pessoas em reuniões OWS mostram outra faceta do ser humano: temos uma sede de relacionamento profundo e autêntico.
Em protesto contra a expulsão de manifestantes pela polícia, os clérigos da Catedral de São Paulo, em Londres, demitiram-se.

O Arcebispo de Cantuária pediu um imposto sobre transacções financeiras, como tinha feito o Conselho Pontifício de Justiça e Paz, e condenou a excessiva remuneração dos executivos.

Talvez agora, incentivado pela voz pública, o governo possa enfrentar os interesses das empresas, e os cidadãos possam restaurar a justiça económica. Ou seja, um governo melhor e um mundo mais equitativo e sustentável.

O mundo — em especial a Europa — precisa de uma Economia com face humana, porque a Economia focada na eficiência e na maximização do rendimento, foi um fracasso e não legitimidade moral nem capacidade para vir impor as soluções para uma crise que ela causou.

Braga... porque ninguém ama o que não conhece